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Bienal de Pernambuco: festa literária, mercado editorial e o desafio do legado cultural

Por Redação NL – Notícia Livre

Falta um mês para a abertura da XV Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, que chega aos 30 anos de existência e se consagra como a maior feira literária do Nordeste e a terceira do país. De 3 a 12 de outubro, o Centro de Convenções de Pernambuco, em Olinda, se transformará em vitrine para editoras, autores, livreiros e milhares de visitantes. Mas, para além da euforia do momento, cabe refletir: qual é, de fato, o papel desses grandes eventos literários? E que marcas eles deixam na cultura local quando as luzes se apagam?

O espetáculo da leitura

A Bienal não é apenas um encontro com livros e escritores: é também um evento-espetáculo. Grandes nomes — como Mia Couto, Itamar Vieira Jr., Aline Bei, Cida Pedrosa, Raimundo Carrero, entre outros — dividem o palco com jovens estreantes, numa programação que mistura debates, oficinas e lançamentos. O tema desta edição, “Ler é sentir cada palavra”, reforça a ideia da leitura como experiência sensorial, acessível e plural.

Contudo, há quem questione se a experiência se encerra nos corredores lotados e nas filas por autógrafos. Não raramente, a Bienal se converte em um shopping literário, mais preocupado com a circulação de best-sellers do que com a formação de leitores críticos.

O mercado por trás da festa

Movimentando a economia local, a Bienal depende de patrocínios robustos (Petrobras, BNB, Itaú) e da Lei Rouanet para se viabilizar. Isso garante a estrutura grandiosa, mas também reforça o caráter mercadológico da feira. Como lembrou Rogério Robalinho, organizador do evento, “o desafio é inserir Pernambuco no circuito nacional dominado pelo Sudeste”. A estratégia é válida, mas ainda coloca a literatura sob a lógica da visibilidade e do consumo, não necessariamente da permanência.

O que fica depois?

A grande pergunta é: o que sobra da Bienal após os dez dias de festa?
Há, sem dúvida, ganhos simbólicos — como o reconhecimento da feira como Patrimônio Cultural Imaterial do Recife. Há também estímulo ao turismo cultural e uma sensação de pertencimento para quem participa. Mas, em termos de legado, os resultados são menos evidentes. O acesso à leitura na rede pública de ensino, por exemplo, continua limitado, e o mercado editorial local permanece frágil diante das grandes corporações.

Entre tradição e futuro

Com três décadas de história, a Bienal se consolidou como celebração da palavra escrita. Mas seu futuro depende da capacidade de ultrapassar o caráter de “grande feira de vendas” e assumir-se como política de Estado para o livro e a leitura. Isso significa investir em continuidade — bibliotecas, programas permanentes de mediação de leitura, valorização de autores locais e ações nas periferias.

Em última instância, a Bienal deve responder se quer ser apenas um espetáculo passageiro ou um motor transformador da cultura pernambucana. A festa é necessária, mas o legado precisa ser maior que os dez dias de euforia.

Foto: Reprodução/Divulgação

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